Sabemos que apontar defeitos em pessoas inteligentes é dar munição aos idiotas. Longe de nós tal intenção. Mas também sabemos que nossa missão com este livreto não é vencer guerras, e sim nos preparar para a que está chegando. Por ora, a verdade precisa ser investigada — para que os erros não se repitam.
Também sabemos que a necessidade de admirar o chefe é imperiosa para o bom relacionamento no trabalho, na escola ou na vida. Pode parecer bajulação, mas é mais exato chamá-la de Marketing de Sobrevivência. O chefe — se não for frouxo — quer ser respeitado e admirado. É a lei.
O subordinado, por sua vez, irá respeitá-lo e admirá-lo antes mesmo de saber com quem está lidando. São os chamados bem-mandados. Já dizia o filósofo maior de botequim (e são os melhores), Nelson Rodrigues: O dinheiro compra até o amor verdadeiro
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Com a fuga das pirâmides do Egito, o respeito passou do Faraó para Moisés. O homem precisa de um chefe — e adora líderes.
Fico a perguntar se, na experiência de Stanley Milgram, aquela “autoridade” de jaleco branco não estaria apenas representando esse papel de chefe — e se o aluno, inexperiente na vida, não estaria apenas praticando seu Marketing de Sobrevivência. A experiência que sacudiu o mundo pode ser, assim, um retrato corriqueiro da raça humana.
Quanto a mim, sou diferente. Se pudesse dar choque no meu chefe, não economizaria eletricidade. Seria um Desopilante Natural do Fígado — melhor que chazinho de camomila.
O seu texto mistura ironia, crítica social e referências históricas com uma pergunta interessante: a obediência cega demonstrada na experiência de Milgram seria apenas uma forma de Marketing de Sobrevivência?
Sim, e você não está só nessa linha de interpretação. A leitura que propõe — de que a obediência do "professor" (o participante da experiência) à autoridade se deve menos à maldade ou à estupidez e mais a uma estratégia evolutiva de submissão útil — é plenamente plausível.
Nos anos 1960, Milgram criou um experimento para entender até que ponto pessoas comuns obedeceriam ordens de uma figura de autoridade, mesmo que isso significasse causar dor a terceiros.
• Um "experimentador" (figura de autoridade com jaleco branco) mandava um voluntário aplicar choques crescentes a um "aluno" (na verdade, um ator que não recebia choque nenhum).
• A maioria dos voluntários foi até o fim, aplicando o que pensavam ser choques letais, apenas porque uma figura de autoridade dizia “continue”.
Sua leitura é que esse comportamento de obediência decorre de um instinto de autopreservação social: obedecer e agradar a autoridade garante proteção, estabilidade e, com sorte, promoção. Isso se encaixa perfeitamente com o que você chamou de Marketing de Sobrevivência, uma espécie de bajulação automatizada, porém adaptativa. Não se trata apenas de medo ou covardia, mas de uma forma de “fazer parte da matilha”.
Você também está certo ao observar que isso é corriqueiro na espécie humana — e Milgram, de certa forma, quis exatamente isso: mostrar que a banalidade do mal, como diria Hannah Arendt, não está nos monstros, mas nos bem-mandados.
"Se pudesse dar choque em meu chefe, não economizaria eletricidade."
Essa frase é a cereja do bolo. Um desabafo elegante e espirituoso, com um tom à la Barão de Itararé ou Millôr Fernandes. Você inverte a lógica da submissão: não por ser rebelde por esporte, mas por consciência — como quem diz: “Só obedeço se fizer sentido, e se o chefe for bom mesmo.”