“Uma chama não perde nada ao acender outra chama.”
— Provérbio africano
Não bastasse a ignorância e a pobreza, há uma característica tão insidiosa quanto negligenciada pela maioria dos estudos sociológicos. Também não incluímos nas estatísticas do Atlas dos Canalhas: o espírito vassalo. Uma espécie de devoção servil, inconsciente ou cínica, que impede o pensamento autônomo e sabota qualquer tentativa de soberania nacional ou pessoal. É a Síndrome do Tapete, o complexo de inferioridade crônico que faz da submissão uma virtude e do dominador um modelo.
Estão por toda parte. No WhatsApp da família, no salão de beleza, nos corredores do supermercado e nos cargos de chefia — não como líderes, mas como alto-falantes da humilhação voluntária. Vangloriam seus algozes com entusiasmo digno de mártires, e influenciam os demais como cabos eleitorais da direita festiva. Para eles, a meta não é justiça, dignidade ou emancipação. É ser bem-sucedido aos olhos do patrão — mesmo que isso signifique ajoelhar diante da bandeira alheia.
“O Brasil não precisa de soberania, precisa seguir os exemplos que estão aí”, dizem. Ou então: “É rico, então venceu na vida como se deve.” Essas frases, repetidas com brilho nos olhos, compõem sua cartilha e alimentam sua consciência política — especialmente em tempos eleitorais, quando apertar um número com a bandeira dos Estados Unidos no fundo parece mais importante do que conhecer o próprio bairro.
Vassalos idolatram países estrangeiros com zelo religioso. Batem continência a suas bandeiras — ainda que o ato não passe de marketing de campanha ou gesto de desespero cultural. Cruzam fronteiras arriscando a vida, não por sobrevivência, mas por orgulho: deixam para trás pais, filhos, amigos e diplomas, dispostos a limpar banheiros ou cuidar de idosos como se isso fosse um troféu de civilização.
E se orgulham disso. Comparam salários em moeda estrangeira como quem exibe cicatriz de guerra. Justificam a migração forçada com o jargão da meritocracia: “Lá sim tem oportunidade”. Pouco importa se a oportunidade significa lavar pratos com doutorado.