Um dia ele foi canalha. Noutro, foi herói. Depois virou estátua. Até que o povo acordou e jogou a estátua no rio. Assim gira a roda da história dos canalhas — e suas reencarnações tardias.
Ao conquistar poder, o canalha busca também um verniz sagrado: veste-se de defensor da pátria, de salvador da moral, de "homem do povo". Sua canalhice vira programa de governo. Seus crimes, reformas necessárias.
Quando começa a ser criticado, o canalha se reinventa: passa a vítima. "Me perseguem", "sou incompreendido", "lutam contra minha família". A canalhice agora tem lágrimas — cuidadosamente televisadas.
Caído em desgraça, o canalha se transmuta em mártir nacional. Aparece em podcasts, ganha documentário, vira referência de “outros tempos”, “grande gestor”, “homem firme, porém justo”. A memória seletiva da sociedade o lava com creolina e o perfuma com nostalgia.
Mesmo morto ou preso, o canalha deixa herdeiros: discípulos ideológicos, viúvas eleitorais, fundações com seu nome e estátuas erguidas por prefeitos ressentidos. Sua metamorfose atinge o ciclo completo: de escória a símbolo cívico.
Como a fênix da infâmia, o canalha ressuscita de tempos em tempos. Porque a memória é curta, o sistema é cúmplice, e a canalhice é uma técnica refinada de sobrevivência no poder. Basta que uma geração esqueça — ou aplauda.
"O canalha jamais morre. Apenas muda de roupa, de cargo ou de biografia."